quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Não quero sugar todo o seu leite

Não quero fazer o meu
centésimo aniversário.
Quero viver cem anos
em menos tempo,
o tempo longo demais
tende a ser cruel,
escorrendo aos poucos.
Ao contrário,
quero o meu centenário
curto, concentrado
mal-batido,
e devorá-lo com poucos
goles sedentos.
O tempo corre estranho
com minhas amigas tão longe.
É um vazio de
coisas bobas,
de nossas tardes preguiçosas,
de gritar quando as encontro
por acaso, ou não.
Queria poder fazer um brinde qualquer,
me comunicar com poucos olhares,
ligar para dizer que ouvi
aquela música no rádio,
ou que estou bêbada
e que as amo.
Citar Caetano
com apenas uma palavra.
Eu queria
simplesmente
comparar nossos vermelhos nas unhas.

Lisboa tem minhas amigas,
mas elas vão, para sempre,
morar comigo.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Nem curta nem grossa
Sou doce e preguiçosa.
E hoje eu queria poder dizer
fica comigo,
te envolvendo com toda
indolência de sangue
de índio impuro
que corre em mim.
Rede pra dois,
cheiro de mato,
ser livre sem
pensar no fato.
Balançar de um lado
a outro e achar
que somos nós,
aqui parados,
que movemos o mundo.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

This is it


Sabe aquelas crianças de filme iraniano, que estão muito felizes, mas que você, espectador, sabe que vai acontecer alguma desgraça? Então, era assim que eu me sentia com o convite do novo filme do Michael Jackson nas mãos. Era como se eu me assistisse de longe e tivesse medo de perder o convite a qualquer momento, com essa nova onda de violência na cidade. Felizmente, eu estive a salvo dessa doideira toda e cheguei com segurança ao cinema.
Bom, que eu sou fã do Michael Jackson, isso não é novidade para ninguém que me conhece. Lembro que um dos primeiros presentes que pedi na vida foi um disco dele, o BAD e meu tio me deu a fita cassete, nada mais anos 80 que ouvir esta fita enquanto eu dançava os meu passos de jazz. O engraçado é que dias antes de eu ganhar o convite eu revi este videoclipe e fiquei impressionada com a forma que ele dançava, 22 anos depois, imagine então o impacto que ele causou naquela menina de 4 anos que pediu o disco e que adorava dançar.
Durante o filme, eu me sentia aquela menina, não porque o filme era muito bom, mas porque ele me fez lembrar dela e de como era bom ser leve e sair dançando a todos aqueles hits maravilhosos que ele cantou como ninguém. This is it é um filme para fãs e totalmente consciente das suas limitações, ao contrário da sua campanha de marketing que o torna muito maior do que ele pode ser. Portanto, não vá ao cinema esperando o melhor dos filmes, ou o documentário definitivo sobre MJ, não é nem de perto isso. É simplesmente um filme sobre o show que ele iria fazer em Londres e, conforme uma entrevista mostrada no filme, seria a sua despedida dos palcos. This is it, por ironia do destino, acabou sendo a real despedida do artista e também agora pode ser visto em todo mundo e não apenas em Londres, onde seriam os seus shows. É o cinema democratizando os popstars...
Mas voltando ao filme, o interessante é que podemos ver o quanto de vitalidade Michael Jackson, apesar de toda a sua bizarrice, esbanjava aos 50 anos. Ele deslizava suas coreografias características com muita elegância, como fazia no seu próprio (outro) estilo e igualmente leve um Fred Astaire já coroa. E Jackson não apenas dança, faz as coreografias, como escreveu as músicas e acertas seus arranjos de acordo com as necessidades do corpo para sair dançando. O filme mostra como MJ coordenava todos os detalhes daquele que seria o seu último show e não apenas um personagem estranho de uma revista de fofoca: This is it mostra o gênio que parecia adormecido depois de tantos anos sem compor e esse é o seu mérito. Mostra também a contagiante música de Michael que era dançada pela platéia miúda que podia assistir aos ensaios e como seria bom assistir àquele show.
Nas três primeiras músicas há um certo vestígio de decupagem, uma filmagem que parece ter sido pensadas antes, e o resultado é bem interessante com multitelas e Jackson para todas as direções. Já do meio para o final, as apresentações não estão tão filmáveis assim, e algumas vezes, parece que ele apenas se aquecia, indicando uma certa forçação de barra de se querer montar um filme tão longo com tão pouco material. A qualidade das imagens em alguns momentos é péssima, o que prova o quanto é um filme mais preocupado em mostrar, que em mostrar bem feito, algo bem diferente do estilo do chamado “Rei do pop” com suas espetaculares e poucas apresentações durante sua carreira.
This is it não tem a surpreendente qualidade dos videoclipes de Jackson, não é um espetáculo de show, mas é um importante documento, um registro sobre os últimos meses de um grande artista e como tal, vale ser assistido. O filme não questiona nada, não repensa nada sobre a carreira de MJ, não mostra nenhuma entrevista ou qualquer imagem sobre nada além do show que nunca aconteceu; provavelmente, isso será explorado por outros produtos, que renderão alguns outros milhões à família Jackson. Mas para quem quer matar saudades do tempo em que música pop era de excelente qualidade, vendia muitos discos e ainda tocava nas rádios, é uma ótima pedida. Veja e saia do cinema cantando “Heal the world” achando que talvez este mundo ainda tenha jeito. Afinal, nada de ruim aconteceu comigo enquanto eu seguia com o meu convite dourado para o cinema.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Vozinha

Hoje é um dia de dor. É claro que eu sabia que esse dia viria, uma vozinha tão velhinha eu sempre soube que um dia iria se despedir. Bom, aconteceu, ela se foi e me deixou um monte de perguntas que eu nunca terei resposta. Acho que a morte é exatamente este vazio sem respostas.
Eu acho que nunca perguntei para ela como é que é viver tanto. Nunca fiz essa pergunta, e tenho certeza que ela teria me dado uma bela resposta, cheia de poesia e realidade, como ela sempre foi. Foi com toda esta poesia e realidade que me inspirei nela para escrever algumas histórias, uma espécie de realismo fantástico do subúrbio do Rio. A história da Ave-Maria é baseada nela, uma outra história sobre um cacto que escrevi e um dia publicarei também é sobre ela.Ela era a minha principal fonte de informação sobre de onde veio a minha família, foi ela que me contou sobre uma fuga romântica a cavalo de nossos antepassados que queriam se casar apesar da oposição da família. Sempre achei essa imagem linda e adorava pensar que a minha família se formou assim num amor aventureiro que sempre teve tudo para dar certo.
Nos últimos anos eu conversava pouco com ela, confesso. Não sei se ela que falava menos ou eu que parava menos para ouvi-la. Sei que há tempos ela não se lembrava mais desta história de uma fuga romântica a cavalo, e também algumas vezes em que ia visitá-la, ela não me reconhecia. A vida tem desses subterfúgios para nos preparar para quando ela vai se despedindo. A gente acaba se acostumando com a idéia de desaparecer antes que isso aconteça, e nisso, me refiro ao fato de eu desaparecer para ela, nunca o contrário, ela nunca sairá de mim.
Nunca vou esquecer os ursinhos de mãos dadas que ela fazia para me divertir quando eu era criança, uma criança que nunca soube desenhar e sempre se impressionava com isso. Nunca vou esquecer as suas lições de sabedoria, mas é uma pena que entendi tarde demais que “fogo com pólvora explode”, ou eu teria uma adolescência menos explosiva. Eu queria realmente ter aprendido em suas aulas de crochê, mas enfim, quantas coisas deixamos de fazer com aqueles que partem?
Não é só o que deixamos de fazer, mas perder a minha bisavó pra mim é perder um pouco de fé na vida. Secretamente, eu tenho certeza que acreditava que a gente poderia durar para sempre, como ela parecia ser capaz de fazer, a despeito de toda sua fragilidade aparente. Às vezes ela ficava doente e não saía da cama, eu chorava sem parar até que ela se recuperava e tudo ficava lindo, como num bom filme de sessão da tarde que eu adoro. É triste porque além de ter perdido a minha vozinha, parece que eu caí da Terra do Nunca.
Ela sempre foi o documentário que eu nunca fiz e que nunca mais poderei fazer, da maneira como gostaria, mostrando e exibindo a minha avó para todo mundo ver a gracinha que ela era: Ela mostrava um universo que andava no passo de uma cadeira de balanço, ela representava todo um estilo de vida alternativo e low profile que eu sempre admirei e que o mundo agora parece entender o quanto ela estava certa e caminha para copiá-la, numa manobra contra consumismo e catástrofes ecológicas reinantes.
Na verdade, eu nunca consegui filmá-la. Tentei algumas vezes, mas ela ficava muito preocupada com a aparência, em sua cadeira de balanço, sempre falava “oi, oi, oi” e ficava ajeitando o cabelo – que era igual ao seu quando eu era nova, ela falava – e eu não queria mais aborrecê-la com a câmera. Desligava. Quem sabe um dia eu não volto a ligar a câmera e faço o filme assim mesmo, com tudo o que restou em mim? Talvez a morte não seja um vazio de respostas, mas uma chuva, como essa que caiu hoje à noite, forte e incontrolável; a morte deve ser uma chuva de perguntas que nos mostra outras direções e nos ajuda a seguir em frente.

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

As ruas correm como rios
e como rios nunca são
as mesmas.
Rio de mim,
com o papel cheio de
bobagem
penso e peço, por favor,
filosofia barata
pra viagem.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Roubaram a minha bicicleta

Roubaram a minha bicicleta. Quem me connhece um pouco mais, sabe que esse fato me abalou. O problema não é terem roubado a minha bicicleta, mas terem roubado o meio de transporte ecologicamente correto que me leva para qualquer lugar na minha cidade. Roubaram minha companheira de vários filmes feitos e vistos. Roubaram a bicicleta na qual eu ensinei duas amigas minhas a andarem. Roubaram uma certa sensação de liberdade que eu sentia, roubaram parte de um estilo de vida que eu adoto. Tenho outra bicicleta, não é uma perda material, são todas essas coisinhas que foram levadas a reboque, além da inevitável sensação de ter sido feita de boba que ninguém gosta de ter.
Já comprei uma nova bicicleta, mas como falei, o problema de levarem a bicicleta é que junto levam pequenos pedacinhos da sua vida, momentos que são bons de lembrar, um monte de bobagens que dão sentido ao dia-a-dia. Mas o que eu acabei chegando à conclusão, quando três semanas depois, levaram o meu celular novo, é que não vale mesmo a pena sofrer por todas essas perdas que nos deixaram lembranças boas. As lembranças são nossas, ninguém pode levar, morrem em você e nos seus diários, o que levam é apenas um link, um objeto entre a materialidade e as suas lembranças. Continuar, perseverar deixa tudo mais vivo que nunca, faz a sua perda material praticamente ser esquecida, ao contrário do que se viveu e é lembrado.
Afinal, nos levam todos os dias muitas coisas. Às vezes nos levam a energia e nem reclamamos, nos levam a alegria, o emprego nos tomam, a inocência, até a generosidade levam de nós e nós não vamos dar queixa na delegacia, ou reclamamos por aí. Quando pessoas são roubadas de nossas vidas, sem mais nem menos, nos sentimos idiotas, reclamamos, mas nada além disso. Seguimos em frente, vivemos. E é isso que devemos fazer, recuperar a vivacidade, toda vez que nos tomarem ela.
Tem gente que acha que saber viver seria se desligar, nada no bolso, nas mãos ou estacionado por aí, metaforicamente, é claro. Pode ser, não sei. Penso apenas que talvez, saber viver seja exatamente não deixar que as lembranças boas se esvaiam, que as bads não tirem a vivacidade das coisas, mesmo que talvez a gente mude o comportamento, mesmo que talvez a gente precise de uma tranca melhor.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Acho que vou jogar tarot
Escrever, viajar pro exterior
Investigar sacrifícios, intrigas
Bobagens sobre amor
Tudo, quero eu
Qual quer você?

E o que mais quero
É que todo o mundo
Caia em segundos
nas páginas do meu ser.

domingo, 12 de julho de 2009

Caixinha de remédios

Eu tenho uma prima da minha idade que sempre foi uma grande amiga. É dela que tenho as melhores recordações da infância e da adolescência. Na infância, ela morava numa casa de vila, no fim da rua, e quando eu chegava no portão da rua e me via do quintal de sua casa de sobrado, ela descia as escadas e saía a rua inteira correndo e gritando o meu nome até me encontrar. Isso talvez seja uns dos momentos em que eu mais me senti amada na vida.
Outra imagem que eu tenho dela é eu chegando na casa da nossa tia em Cabo Frio e ela estava em cima da árvore, olhando a vida daquele ponto de vista, muito acima da minha compreensão; eu que me achava muito esperta porque lia porcos com asas aos 12 anos. Mas ela que sempre foi muito mais rápida que eu em tudo, falou primeiro, andou primeiro, entrou na faculdade primeiro e já com o próprio negócio, tudo pronto, ela já nasceu pronta e eu nesse eterno forno. Gosto de aos poucos ir me cozinhando. Um dia eu vou para a mesa do café.
Ontem, fui lá na casa dela, tomar um cafezinho e passar o tempo, e lembrar do tempo que planejava a minha agenda com a dela; a vida mostra que infelizmente esses momentos passam. Conversamos como conversam as boas e antigas amigas, atualizando e depois apenas passando um tempinho juntas. Ela está grávida... do segundo filho... Ela realmente é rápida, eu avisei. Eu sabia que ela era casada mãe e grávida, com marido, casa de 2 quartos e um carro na garagem, sempre soube disso, mas ontem tive clareza disso. Vi que na casa dela tem uma caixinha de remédios, no banheiro, e li o nome do remédio que nunca vi na vida “Avatan”. Não era um sonrisal, uma aspirina, era uma pomada com esse nome estranho. Ela tem a sua própria caixinha de remédios, a minha prima é uma mulher adulta, meu deus, como eu tenho orgulho dela.
Vi como é que o tempo passa rápido, logo nesse momento que em menos de uma semana faço aniversário mais uma vez. Pensei que a minha prima saiu daquela árvore e agora tem uma caixa de remédios no banheiro, e que eu continuo com o meu livrinho debaixo do braço, pelo menos, agora sei que preciso aprender mais e mais. Um dia eu tomo jeito e peço a ela para me ensinar, como ela me ensinou a subir em árvores, a ser corajosa, a xingar palavrões, a responder às pessoas. Minha mãe falava: vou descobri quem está te ensinando essas coisas e vou te proibir de falar com ela. E eu morria de medo de minha mãe descobrir que era a minha prima querida que queria e fazia de tudo para que eu crescesse com ela. Um dia eu aprendo. Um dia ela me ensina, como sempre foi na vida.

Amo você, minha querida.

domingo, 5 de julho de 2009

Solares

Barcos solares, carros solares
Canções solares de Cinema Transcendental
Ventos solares, sorrisos também.
Solar é a alegria ao meio-dia
Brindando cerveja na padaria.

domingo, 7 de junho de 2009

Futuros Amantes

Paixão pra mim tem tudo a ver com Futuros Amantes do Chico. A leveza num sentimento desesperado e de dor, no caso, o fim do amor. Nada é pra já. Algo que repito, mas que em nenhum lugar consiga enxergar essa sabedoria em mim. Pra mim, tudo é pra ontem, meu coração urge, apesar do corpo conter uma preguiça quase contagiosa que veio de fábrica. Talvez não há amor ou quase-amor que não me tenha feito pensar levemente nessa música, apesar de no fim do amor eu sempre querer exterminar a pessoa e qualquer lembrança dela, não deixo nada, nem pra mim. Mas isso é papo para uma outra hora, e voltando à música, uma pessoa em especial é dono dessa canção na minha cabeça...
Ontem, ouvindo Futuros Amantes, sem dor, me imaginei não como o poeta que canta que deixou um amor subaquático, que virou um tesouro dos 7 mares. Não, me dei conta que nunca diria nada é pra já, ou deixaria meu amor para futuros amantes. Eu quero viver doses fortes de amor e até a última gota. Não sou o Chico sábio e tranquilão, mas certamente, poderia ser o escafandrista que descobre o Rio de Janeiro submerso. Fiquei pensando que visão fantástica de se encontrar em baixo d’água. Não teria a Lagoa, as praias, mas as montanhas seriam cavernas submarinas. A Pedra da Gávea continuaria misteriosa com seus olhos como uma esfinge e seu desafio mortal. O Pão de Açúcar estaria lá com o cabo apodrecido e intrigando os mergulhadores do futuro. O Arpoador seria um reduto de corais e peixes ornamentais belíssimos que se esconderiam nas pedras. Será que os arcos da Lapa estariam lá no fundo do oceano, coberto de algas? E Santa Teresa, e a Rocinha?
Continuaria a minha viagem olhando tudo ao redor, mantendo-me um escafandrista maravilhado, reviraria tudo e quando encontrasse o Cristo Redentor, eu pararia atônita. Saberia se tratar de um totem, de algo importante naquela sociedade perdida. Olharia sem medo dentro dos seus olhos de concreto e através deles, enxergaria dentro de mim a verdade que nunca consegui ver no espelho. Depois, eu estenderia os braços, repetindo o gesto dessa misteriosa figura e emergiria feliz. Não haveria mais necessidade de se procurar nada, naquele momento de braços abertos nadando sobre o Rio de Janeiro eu entenderia o amor que o Chico deixou na canção e faria as pazes com o mundo, respirando ar pelo nariz. Selaria para sempre uma amizade com o universo e comigo mesma e saberia que sempre há um lugar para ser feliz. E esse gesto de abrir os braços para o universo, que essa sociedade esquecida colocava num alto da montanha era uma maneira de encarar a vida e suas contradições. A partir de então tentaria fazer isso para minhas questões e para as pessoas ao meu redor. No início iam estranhar essa minha personalidade tão easygoing, tão alto-astral. Mas com o tempo, iriam entender essa minha vontade de abraçar o mundo.
Ainda bem que não preciso esperar o Rio sumir e sumirem os cariocas, o Chico, o Caetano, ou quem me faz lembrar essa música, para querer abraçar o mundo. Posso tentar agora, mas mudar, mais do que tudo na vida dá um medo disfarçado de preguiça. No entanto, não custa começar, tentar aos poucos, abraçando as coisas aqui e ali, com o tempo e com a prática eu pegaria o jeito. Afinal, nada é pra já.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Reluz

Gosto do mar
Da vista, do gozo
Do cheiro das tardes
de junho e das noites
de janeiro.
Gosto dos cabelos
tocando a cintura
Entroncar veios
E colar meus seios
Nos seus
Gosto de fitar
sem medo
o moço encabulado,
o gosto das maçãs
(do rosto)
Vermelhas e quentes.
Gosto de ouvir rente
Batidas de um coração
Mergulhar e
Só abrir os olhos
Debaixo da imensidão
preta
Aparecer à noite
E ser a última
A apagar a luz
Gosto daquilo
que nem tudo ouro
E a mim seduz.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

dói
ver
dois
virando
meio
em meio
ao
pouco
que
fica
do
esteio

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Os sinos dobram às 6 da tarde

Adoro morar perto de uma igreja católica. Não porque são bonitas ou me dão paz ou qualquer outro motivo parecido. Gosto de estar perto delas porque às seis horas de tarde elas tocam o sino incessantemente lembrando que são seis horas. Sempre me encantei com a beleza de rituais e esse ding dong de seis horas da tarde me lembra que não estamos sozinhos nesse mundo, vivendo apenas as nossas vidas. É como se fosse um grito do mundo para mim, me dizendo que “a verdade está lá fora”, de que é preciso sair de casa e olhar um pouco ao nosso redor.
Quando eu era criança, minha bisavó, hoje centenária, costumava se retirar no quarto, sentar na cadeira de balanço e ouvir no rádio a “Ave-Maria”. Eu não fazia idéia do que era aquilo, apenas me lembro que achava muito sério a pessoa ficar quieta no escuro do quarto ouvindo o rádio, e rezando pelas pessoas. Lembro que ficava um silêncio em casa, em respeito àquele momento solene. Eu sempre passava correndo pela porta do quarto dela nesses momentos. Tinha medo que um dia ela me fizesse entrar e ficar naquela solenidade escura com ela. Tinha medo do escuro e tinha também medo porque algumas coisas que eu não compreendia estavam naquele quarto com ela. Tinha medo, mas ficava sempre fascinada por aquilo, passava correndo pela porta e via a sua sombra se balançando, mas sempre passava pela porta e olhava.
O café da tarde era sempre depois desse momento sagrado e sentávamos todos à mesa, já resguardados pela oração da matriarca. Hoje ainda nos sentamos à mesa por volta das seis da tarde, minha vózinha ainda está conosco e sempre fala “chega chega chega” assim que começamos a servir o café, mas ela não ouve mais a Ave-Maria, nem fica sozinha rezando no quarto. Acho que agora ela é quem tem medo de ficar sozinha num quarto escuro. Aquela voz catedrática que vinha do rádio no canto do quarto está muda. O que mais terá emudecido nesses 20 anos? Só nesses momentos em que os sinos dobram aqui perto de casa é que lembro que às seis horas se fazia silêncio, se rezava baixinho e se comia o pão agradecido e feliz, certos de que há mistérios dos quais não conhecemos e nunca saberemos ao certo.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Cinema, romantismo e realidade

Essa semana eu vi uns filmes pesadões, estilo prozac, que são lindos, fazem bem, mas vêm acompanhados de uma tristeza, diegética e extra diegética que muitas vezes te derrubam de sua posição confortável da sala de cinema. Os filmes Gran Torino e O casamento de Rachel fizeram isso comigo. Poucas vezes o cinema americano me fez pensar tanto sobre o mundo, seus rumos e suas/nossas pequenas tragédias.
No entanto, toda semana tenho aula sobre musicais, que tenta me mostrar que essa moeda chamada mundo tem dois lados, e muitas vezes me faz recobrar a fé na humanidade, cantarolando a canção final de cada filme. Confesso que musicais muitas vezes funcionam melhor que religião para me colocarem em estado de graça. Como assistir a O Casamento do Meu Melhor Amigo ou Vamos Dançar sendo minimamente romântico e não dar um suspiro profundo e um sorriso para o horizonte? Os problemas só começam depois desse suspiro, desse sorriso e voltamos para o mundo real (ou a sociedade de controle, como disse uma amiga minha foucaultiana).
Eu sempre gostei desse tipo de filme que te suspende da realidade, te coloca por alguns minutos fora de si, uma espécie de purificação das mazelas que encontramos no dia-a-dia. Tenho noção de que aliena, de que esquece o mendigo que pede esmola na porta do cinema ou das crianças que assaltam na saída, mas esse é o objetivo, te colocar por alguns momentos longe disso tudo. Longe, tão longe, tão absorta que você é capaz de acreditar que tudo aquilo pode ser verdade. Como canta Fred Astaire no fim de Cinderela em Paris “He loves and she loves so why can’t you love and I love too” coerente e convincente. Todo esse mundo de escapismo que conscientemente parece uma bobagem, um programa inofensivo depois dessas tardes lindíssimas de outono no Rio, são um verdadeiro veneno, e não um elixir para encarar a realidade. Essas bobagens românticas mexem tão profundamente com as nossas emoções, que passam a ser algo desejável e possível no universo feminino.
Romantismo, cinema e realidade, sempre foi uma questão para mim, pelo menos nos meus diários, acredito que o romantismo no cinema moldou muito da minha forma de agir, pensar e principalmente, esperar da vida. A verdade é que se cria um choque de ordem ao viver a realidade ao mesmo tempo em que estamos tão acostumadas aqueles códigos que assistimos no cinema, e desde criança, que nos levam a acreditar que o amor está em cada esquina, puro, indolor e arrebatador. Nem falo nos “filmes de princesas”, mas Tarzan da Disney, por exemplo, nos leva a acreditar num estatuto de amor e de ideal de vida, que ninguém espera ver muito num filme que gira em torno de macacos. Love is in the air, gritam e quando olhamos ao redor, só vemos pessoas, e muitas vezes as interpretações erradas ou tendenciosas levam a verdadeiras catástrofes, tendo a destruição do amor-próprio como a mais leve delas.
Pôr-do-sol, boa conversa, e, insisto, essas tardes de outono, elementos desse universo romântico, predominantemente feminino, levam pessoas iniciadas nesses códigos a interpretarem esses eventos como índices de amor verdadeiro. Aquele que o Fred Astaire canta e dança para a Ginger Rogers, aquele que a Julia Roberts já teve às dezenas, aquele que você insiste em buscar no seu presente, passado ou futuro.
Buscam-se esses signos cinematográficos na vida porque se deseja a felicidade mostrada na tela, como uma promessa de vida eterna. E as mulheres repetem, muitas vezes com as amigas, esse mantra do simbólico romântico como ideal de vida. Repetem porque “a felicidade é o desejo de repetição” como diz Kundera. Pergunto, será essa promessa de salvação romântica apenas um mito? Não será o amor romântico possível em nenhum espaço/tempo da nossa realidade?
Infelizmente não sei responder a essas questões. Acontece que não tenho a imparcialidade necessária para seguir investigando, pois sofro de um romantismo incurável alimentado pelo cinema americano, pela música, pela literatura, e que se retroalimenta no universo feminino. Só no universo feminino mesmo para se acreditar nessas coisas... por isso Lacan diz que a mulher não existe. Essas mulheres não existem mesmo....

PS: para as minhas amigas lindas e o universo feminino que construímos juntas

domingo, 17 de maio de 2009

Oito é o símbolo do infinito - para o filme das mulheres

Somos ao avesso, o infinito:
Universos em expansão
Agüentando a pressão
dos contornos femininos.

Orgasmo

Pra ti
Menti.
Preparo
Anteparo
Para-raio
De sentir
Sem ti.

sábado, 16 de maio de 2009

Choque de ordem

Limparam todo o caos
que se instaurava
há tempos em mim.

De repente
acordei sem
angústias, sofrimento
ansiedade, vontade
levaram tudo na
enxurrada
e do nada
que ficou
percebi
que me levaram
também daqui.

domingo, 10 de maio de 2009

Dia das mães

Hoje é dia das mães e dia das mães sempre foi uma data importante na minha família. A minha bisavó Nina, a maior figura que eu já conheci e ao mesmo tempo a grande figura materna da minha mente, fazia aniversário perto do dia das mães e sempre se comemorava seu aniversário no domingo, reunia a família toda num almoço na casa da minha avó, outra grande imagem de mãe que eu tenho.
Numa data tão importante, há uns dezessete anos atrás, nossa eu to velha... Mas há anos atrás eu resolvi fazer uma grande surpresa para o dia das mães. Era uma grande coisa para mim, eu que sempre fui tímida, quieta, resolvi entregar cartões para todas as mães da minha família. Para isso, fiz uns versinhos bobos de menina de oito anos que rimava amor com flor e alguma coisa sobre mãe, mas que para mim, era um grande acontecimento, já que eu iria mostrar pela primeira vez os meus versos publicamente. Aqueles cartões de dia das mães eram a minha primeira publicação, nunca eu tinha mostrado para ninguém as coisas que eu escrevia, que naquela época, não deviam ser muitas.
Não só fiquei encarregada dos versos, mas era responsável pela concepção do agrado, e fiz todo design, que constituía em uma folha A4 que cortada ao meio (a cada folha eu fazia 2) com um coração no meio, com os versos dentro do coração, e pintei em volta com lápis de cor. Em baixo, tinham duas linhas, uma eu escrevia o meu nome e na de baixo o nome da mãe que receberia, num estilizado De Para. Estava muito orgulhosa de mim, eu não só tive coragem de me mostrar artisticamente, como assumi a minha falta de jeito para pintar e desenhar e a minha letra feia, que sempre foi um problema para mim.
Não sei que ímpeto de coragem foi esse, de me mostrar tanto de uma vez só. Eu já dançava, me apresentava em vários lugares com “as meninas do Jazz”, mas não tinha coragem de mostrar nada além do meu rebolado, mas naquele ano, seria diferente, fui com a cara e a coragem e sem medo de ser feliz ou usar clichês. O poema era “Mãe, nome de amor, mulher de magia, e toda mãe é uma flor”. Ou alguma coisa parecida.
Fiz os cartões, e usei um critério objetivo para as destinatárias: aquelas que estariam na festa daquele domingo de 1992, e eram mães. Minha avó Dorinha me ajudava com as tias mais velhas que eu não sabia se tinham ou não filhos. E assim eu fiz vários cartões, não sei quantos. Perto da data, orgulhosa de mim mesma, fui mostrar a surpresa para a minha grande amiga e cobaia nas minhas coreografias que eu insistia em inventar e ensaiar todas as noites, a minha madrinha.
Eu espera agradar pelo gesto fofo e singular que estava praticando, mas provavelmente, eu queria mais era fazer propaganda da minha própria concepção que agradar às mães. Sabe aquele altruísmo egoísta próprio de artistas? Já havia um embrião disso tudo naquela época. Só que a minha Dinha ao olhar os cartões me repreendeu: “Como você não fez para sua Dindinha? Eu sou quase uma mãe pra você?”. E ela falava a verdade. Naquela época, ela praticamente morava na minha casa, e cuidava de mim como uma filha. Eu não tinha feito para ela, porque na época, ela devia ter a minha idade hoje e não era mãe. Foi uma dura lição que aprendi sobre usar critérios objetivos e excludentes, e na faculdade de Direito, anos mais tarde, eu tentava mudar esse tipo de classificação ao me dedicar a estudar o Direito Alternativo e essas coisas que não tem futuro. Aprendi também naquele dia que nem sempre se agrada com o que fazemos, e fiquei realmente triste de não ter feito para a minha dindinha. Resolvi, então, não entregar a ninguém aqueles cartões. Guardei na gaveta e levei anos para mostrar para qualquer outra pessoa os poemas que fazia.
Anos mais tarde, na adolescência, eu também com medo de que alguém lesse os meus poemas que eu havia escrito na tenra idade dos 12, 13 e 14 anos, apaguei o disquete que há anos eu colocava tudo que eu escrevia, perdendo para sempre os poemas apaixonados dos amores fugazes e platônicos daqueles anos. Depois, com medo do meu namorado ciumento, escondi meu caderno poemas dentro do cesto de roupa suja, para ele não ver que eu continuava a escrever para o ex. Meus poemas sempre ficaram assim, em gavetas e armários temendo a crítica.
Ano passado, arrumando uma gaveta encontrei desenhos de quando eu era criança e lá estavam os cartões. Eu havia esquecido dessa história, mas no momento em que olhei aquele coração com versos, lembrei de tudo. Hoje escrevo versos na internet, resolvi publicar tudo que crio, não porque me acho o máximo, mas porque poemas na gaveta são como ressentimentos e auto-repressão guardadas. Não quero isso, quero dançar como dançava quando era criança e todo mundo achava engraçadinho. Quero dançar palavras.
Hoje, a mesma Dinha, que hoje tem uma filha que eu amo muito, veio me ver e reclamou enquanto eu estou aqui escrevendo esse texto: “Você nem me deu feliz dia das mães”. Ainda bem que hoje, minhas gavetas estão abertas.

sábado, 9 de maio de 2009

fiz um poema concreto
e queria muito que
ele virasse
realidade

Amor em espécie

Não trabalho com crédito,
débito, ou acordo.
Nesse pregão onde coloco
meu coração em risco,
aceito apenas
Amor em espécie.

Mas por hoje,
posso ficar com
esse título firmado
na verborragia
silenciosa
dos nossos olhares.

sábado, 2 de maio de 2009

Cheguei em casa.
Encontrei a sua cara
Amassada de dormir
Olhos pequenos de remela
e lágrimas de sono.
Um sorriso.
Meu coração acelerava
Mais que a formula 1
Na TV de madrugada
– um café?
– não.
Quero apenas
Deitar, rolar na cama e,
querendo, sem querer,
subir em você,
beijar o canto esquerdo
da sua boca,
encostar o meu nariz
no teu
e dizer: “boa noite, moço”,
sorrir
e depois dormir
cheirando o teu pescoço.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

O feminino e o caos

Parcelo as minhas dores
em poemas a perder de vista.

Você pede calma,
me manda ser tranquila

eu explico que nunca vi controle
reinando
na metade fêmea do artista.

domingo, 26 de abril de 2009

Cauby, Garrel e Tecnicolor

Chorar até as lágrimas molharem o pescoço .Acordar com aquele olho inchado, não comer, não dormir, desligar o telefone. Depois, perceber que era mais uma egotrip descontrol e voltar à vida sem nenhuma seqüela. Quantas mulheres já não fizeram isso. Ouvir Cauby, escrever cartas para não entregar, e na segunda-feira se entregar sem medo à própria rotina, como depois de um sonho ruim. Queria entender a necessidade dessas viagens ao inferno que algumas vezes fazemos, sem muita necessidade. Serão os hormônios, ou a nossa necessidade de encontrar os próprios demônios? Não sei. Mas sei que essas viagens clareiam um pouco a nossa percepção, nos fazem pensar em coisas que não pensaríamos normalmente.

Assisti “A fronteira da Alvorada” de Phillippe Garrel e provavelmente foi o que desencadeou essa egotrip novinha em folha. O filme fala sobre várias facetas do amor e da felicidade. A felicidade burguesa aparece como meta e ao mesmo tempo motivo de fuga. O amor romântico e o amor doentio desfilam nos mais lindos tons de cinza da fotografia. Nada é total, nenhuma felicidade é plena. Essas são as lentes da nossa geração complicada, que não luta por nenhum objetivo coletivo e acaba um pouco perdida nos desígnios incertos do amor, que parece ser o único tema universal que ainda prevalece.

Depois dessa, prefiro voltar aos anos 50, ver uns musicais com o Fred Astaire e me isolar no Tecnicolor. Não há crise ao som de Cole Porter, esse sim, atemporal.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Dia de Folga

Hoje de manhã
li o jornal,
lavei os sapatos,
esfreguei as bolsas,
arrumei as gavetas.
À tarde fui ao médico
ao DETRAN,
passei nos Correios,
liguei para o advogado
e para a Prefeitura.
À noite peguei um cineminha.

Juro, nunca me senti tão livre
Em toda minha vida.

sábado, 18 de abril de 2009

Boleros nossos versos são banais

Pra você eu fico assim
Escrevendo letras de bolero
Sem melodia ou dança
Apenas aquela coisa de
Rimar amor com dolor
Sufrir
com morir
E aquela fossa conhecida
Exímia bailarina,
Que vai de papel pra mim.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Não aperto o passo,
nem apresso o fôlego.
Mas tenho uma tranquilidade
nervosa
revelada por uma vontade
irresitível e recorrente
de posicionar braços, dedos
pernas, boca, pescoço
e então acender
tragar e cuspir fumaça
em palavras.

Click

Ontem no almoço com amigos, um amigo disse que gostaria de congelar um pouco a sua vida. Dar um pause e não simplesmente o stop, que seria segundo ele, muito dramático. Eu acho que a gente consegue esses recursos normalmente, só um pouco de imaginação, é possível paralisar a vida, passar rápido, fazer replay, até andar para trás. Não to falando do controle do Adam Sandler, é só ser um pouco mais atento e saber a maneira que se quer viver. O problema é que a maioria do tempo a gente deixar rolar, como um fluxo televisivo ao vivo com uma câmera e sem edição.

Dos recursos possíveis, o que eu queria me interessa mesmo é a trilha sonora, passar algumas cenas em slow motion e corte seco nos engarrafamento. Isso é difícil, mas mesmo assim, dá pra improvisar. Andar sempre com um mp3 player, prestar muita atenção nos momentos importantes e levar um bom livro enquanto espero no trânsito são alternativas. Mesmo o fluxo ao vivo pode ter uma mesa de corte. A gente pode editar da maneira que quisermos é só realmente querermos algo.

domingo, 12 de abril de 2009

Posso não realizar meu sonho
de morar num musical,
mas ter as pernas da Cyd Charisse
não seria nada mal.

Romantismos

Queria me permitir
sonhar o sonho
careta feminino:
amar e ser amada
casar e ter filhos.
Mas não é o meu tipo.
Sonho e procuro
sempre
a utopia de um
amor
quase perdido.

PS: Não será essa também
uma faceta
do mesmo feminino
careta?

Angústia

Não sei o que acontece e qual a finalidade de se acordar no meio da noite com uma angústia sem fim depois de um sonho ruim. Eu corri para cá, para escrever, quem sabe eu não consigo algo bom, quem sabe eu não me acalmo e tudo passa. Mas que sentimento louco que um sonho louco desencadeia. Os sonhos normalmente mostram pra gente o que precisamos ver, seja por algum desejo não realizado, seja algum sentimento escondido. Mas juro que preferia estar dormindo como um anjo. Já vi que literatura esse sonho não rende, nem auto-análise. Me entrego rendida apenas pela vontade louca e ininteligível de se publicar sentimentos. Por que isso?

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Ventania

A solidao já não
me agrada.
Ouço os passos
na escada.
Não são seus.
Apenas meu desejo
me faz sala
nessa casa.
Abandonada
como eu.

Sobre blogs

Continuando na minha ego trip, transformando o que é privado em público, me pergunto quem teria paciência de ler texto tão reflexivos, auto-conscientes, numa palavra, narcisistas? Acho que o blog não é apenas uma ferramenta para se expor publicamente, mas principalmente, uma espécie de possibilidade de se expor para si mesmo, uma espécie de auto-análise que aqueles que gostam de escrever embarcam. Uma mistura de mídia, literatura e Freud.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Inúmeras possibilidades que o universo apresenta. Não é papo de doidão não, mas percebo que a cada meia hora de vida uma pessoa muito talentosa consegue extrair um roteiro de longa. Continuando a ego trip...
estava eu aqui em casa, esperando a minha manicure chegar. Não sou do tipo que espera a manicure chegar, mas enfim, um dia conto a história, minha manicure é uma figuraça. E ela chegou com seu filhinho de 1 ano com o rosto pintado de coelho da Páscoa. Ela fazia a minha unha e o menininho derrubava tudo ao nosso redor. Quando ela pintava os meus pés, me lembrei que hoje comemoramos a última ceia e o ritual do lava-pés, na cultura cristã. E lá estava ela, mais que lavando meus pés, mas embelezando-os. Pensei o que nos une é muito além dessa prestação de serviço que se dá toda quinta-feira. A gente conversa e hoje ela trouxe o filho para conhecer "a tia". E eu, queijomaníaca, dei queijo para o menino comer pela primeira vez, e fiz mais uma vítima. O menininho de 1 ano grudou nessa droga alternativa feita de leite.
A gente divide o nosso tempo. Sua forma de ver a vida, seu bom-humor acabam fazendo parte da minha vida, até de maneira inconsciente. Mas tenho certeza de que também convivo com ela, além desse momento semanal. Ai, como queria escrever um roteiro sobre uma história parecida, que fosse diferente dos filmes que já foram feitos sobre o tema. Sei lá, um Caçador de Pipas, menos fábula e menos inferno, sobretudo, feminino.
A unha atrasou e fui para o mercado, enrolada, bati com o carrinho do vizinho, na verdade, nunca fui motorista que se preze. O cara sorriu pra mim e eu pensei que poderia estar numa daquelas crônicas engraçadíssimas do Veríssimo, onde os diálogos surpreendentes simplesmente brotam. Mas abaixei o rosto e segui pelas gôndolas. Encontrei de novo com o cara perto dos vinhos e me dei conta que não, não era uma crônica do Veríssimo, talvez, uma comédia romântica, uma série americana, eis que ele pergunta:
_ Comprando vinho pra Páscoa?

Meu Deus, hoje é quinta-feira e esse cara tá comprando vinho para o domingo???? Não tive outra alternativa a não ser responder.
_Não
_ Ah, tá... Por que então?
_ Coisa de bêbado
Achei ele intruso e a única maneira de responder foi como se estivesse num filme noir. Me senti o Bogart prestes a dar uma baforada e fiquei muito feliz com isso. Abandonei o abusadinho com um vinho na mão e querendo saber sobre a qualidade da marca.
Voltei para casa. No caminho, uma gangue de menininhos-mau-encarados-zona-sul-de-niterói. Mesmo assim fiquei com medo. Mulher, sozinha se sente desprotegida, ainda mais quando eles tinham pedaços de pau na mão. Andaram atrás de mim por uns 10 minutos, mas nada aconteceu. Mais um gênero cinematográfico a se explorar, mais um roteiro perdido. Esse podia, na verdade, estar até naquele primeiro filme que não escrevi, o sobre mulheres, e contratar mostrando também esse universo masculino.
Onde está o gênio perdido que não escreve todas essas histórias enquanto seguimos a nossa rotina banal. Como se escreve o Anjo Exterminador, Antes do pôr-do-sol, Quanto mais quente melhor, No silêncio da noite e tantas outras maravilhas por aí. Quantas não estão perdidas, porém, sugeridas por toda a parte.
Lamento eu não ser o Carrière e tirar pérolas do nariz do dia a dia.

tempo tempo tempo tempo

Continuando essa ego trip, metrô ao meio dia numa quarta-feira. Mais meio da semana impossível, e para completar, não estava nem cheio nem vazio. Entrei. Só tinham dois lugares sobrando que deixei para um senhor sentar primeiro, e depois me sentei ao seu lado. Olhei para os lados e queria saber como estavam as coisas ao meu redor. A impressão era de que a vida seguia igual, sem novidades, pessoas ensimesmadas em suas rotinas como que esperando nada além daquele caminhar interrompido vez ou outra do trem. Olhei e ao olhar para o meu lado direito, bem onde estava aquele senhor que chegou junto comigo, vi o seu imponente relógio digital. Tenho uma mania horrorosa de querer olhar os relógios alheios. Nunca usei relógios, talvez, quando eu era criança e ganhei um relógio que trocava de pulseiras, eu devo ter usado todas as pulseiras pelo menos uma semana. Mas essa é a minha experiência mais próxima de calcular o tempo, nunca fui atleta e por isso, nunca tive recordes a quebrar. Além de que, eu morava com a minha avó, que não tinha e não tem tempo para nada, ou seja, seu tempo nunca acaba. Seu caminhar, suas atividades, sua órbita transita em um tempo diferente do relógio, que, diga-se de passagem, é totalmente arbitrário, imposto. Minha vó não, minha avó nunca se submeteu a esse tempo cronológico e sempre foi no passo que lhe conviesse, o que me fez treinar, criança ansiosa, de que é preciso paciência para esperar alguém tão original. Por isso, me obrigo a calcular o tempo com a minha percepção de tempo e talvez por isso, eu esteja sempre atrasada, mesmo que às vezes eu saiba exatamente quantos minutos passaram
Mas naquela quarta-feira no metrô, eu olhei mais uma vez para aquele relógio alheio. Olhei por curiosidade, para saber a hora. Olhei e me dei conta que não tinha a hora e sim, um cronômetro que marcava 1minuto e 25 segundos. Esse tempo era provavelmente o tempo que o metrô tinha saído de Copacabana. Ou seja, aquele senhor que sentou ao meu lado, zerou o cronometro no momento em que o trem saiu da plataforma. À primeira vista, me assustou ver aqueles milésimos de segundo correndo no visor, fazendo os segundos parecerem lentos, ver como o fluxo do tempo não para e que a vida se escorre nessa rapidez, como numa ampuleta. Depois, fiquei me perguntando, por que aquele senhor de bermudas e havaiana queria cronometrar o tempo, da zona sul aonde quer que seja. Pra quê? Será que lhe interessam problemas matemáticos, ou físicos, aceleração, essas coisas que não penso desde o vestibular? Não parecia.
Já pensei sobre a nossa vida encatracada e essa necessidade de alimentar a máquina na hora certa, passar o cartão para entrar no trabalho, colocar o bilhete na catraca antes da barca sair, olhar a hora e partir para a aula, esperar um pouco e só ir embora quando a catraca marcar exatamente sua jornada diária. Mas colocar uma catraca no pulso e passar a viver em função dela, foi um soco na consciência, e quase um acelerador automático para perceber a vida.
Mas aquele senhor de bermudas provavelmente pensava diferente, parecia que ao saber cada segundo do seu caminhar, se sentia Senhor do tempo e Senhor de si próprio. Como se olhando o relógio e seguindo em frente pudesse controlar cada segundo solto de sua longa vida. Será que ele fazia isso há muito tempo em relógios de ponteiro e cordas, será que foi um hábito que ganhou com a idade, será por algum problema de saúde, controlar o coração, quem sabe? Nessa divagação toda, percebi que ele se incomodava ao me ver olhando para o seu relógio. Como se o seu relógio fosse poder unicamente seu, e mais ninguém poderia controlar o seu tempo.
Tentei disfarçar, mas já tinha virado uma obsessão saber a diferença entre cada estação. Botafogo 4’28”, Largo do Machado 8’46’’e assim, sempre que ele percebia que eu olhava o relógio, colocava-o fora do meu alcance, e fazia os segundos parecerem eternos. Ao chegar na Cinelândia, ele correu e saiu por outra porta, guardando a informação derradeira que só cabia a ele: a odisséia até o centro num dia normal num metrô normal e sua duração normal. E eu atrasei o passo, olhei os relógios malucos da cidade e voltei a perceber o mundo onde o tempo é contado pelas diferentes músicas e pensamentos que passam na minha cabeça

Ego trip

Por que ter um blog, porque transformar parte dos meus diários que guardo às 7 chaves, exposto para qualquer um na internet, por que essa ego trip descontrol? Digo apenas sim, Eu quero sims eu amo Sims, como disse James Joyce.