quarta-feira, 29 de junho de 2011

Sou o som do sabiá.
Soube sibilar
um símbolo santo
secreto
que se sente só

sou senhor sem
sonhos
sou ciente do
seu senso de solidão:
sempre sei se sou
saudado ou não

sou simples
saio sem sentir
assobio sábio
suor, sono, surto
sigo cego:
passáro, sol, silêncio.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

ando com uma mania nova:
à noite, antes de dormir,
repasso todo o meu dia
como se você estivesse comigo
conversas no bar, mergulhos
festas, compras no mercado.
E o dia que poderia ter sido
é tão lindo
que vou dormir feliz.

domingo, 19 de junho de 2011

paixão se cria
como um traço
uma fumaça no ar
um poema mal-feito

criei uma paixão um dia
era gorda, grande e feia
mas eu a amava!

ela fugia de mim
e eu a inventava diferente
rala, chocha, murcha
até que um dia
alguém inventou
uma paixão-relâmpago
que fulminou tudo ao redor
e eu só vejo o clarão

quinta-feira, 9 de junho de 2011

asa nisi masa

Eu, Ele, Eu, Eu-Ele,
em corte seco,
enquanto invento uma memória:
o cheiro do quarto
do copo de café
do tapete lavado,
também estou lá.
Dois espelhos se miram
e me vejo espalhada
em telas:
olho para Ele
e infinitamente
me repito
em abismo.

terça-feira, 7 de junho de 2011

ser ou estar

Em português temos a possibilidade de falar ser ou estar, em verbos diferentes, como coisas diferentes e eu sempre gostei disso. Parar o instante com um verbo nas outras línguas é impossível. Me lembra o portal de Zaratustra, que é das coisas mais linda que conheço e reproduzo aqui:
"Este longo corredor para trás: ele dura uma eternidade. E aquele outro corredor adiante é uma outra eternidade. Eles se contradizem, esses caminhos; eles se chocam frontalmente: e aqui nesse portal é onde eles se juntam. O nome do portal está escrito ali em cima: INSTANTE.

É como passar pelo portal a cada momento, portais e portais consecutivos: estou feliz, estou romântico, estou com fome, estou cansado, estou calma. Em outras línguas existe a não menos bela ambiguidade de que tudo que é não necessariamente será. Nós que passamos no portal, às vezes empurramos as coisas para o próximo portal, para o estatuto do estar, porque se as coisas são em português, elas são; sérias e definitivas.

Eu estou com saudade de escrever poesia.